domingo, 30 de março de 2014

Há Cinquenta Anos, aqui no Brasil...

.... políticos civis abriram as portas para uma ditadura militar, golpeando a democracia, ao ilegalmente considerarem ausente do País e deporem um presidente da República que sabidamente se encontrava em território nacional;
.... homens que se julgavam superiores decidiram se arrogar o direito de mandar arbitrariamente em toda a população, sem terem sido eleitos para tanto;
... os partidos políticos foram emasculados, os parlamentos nacionais inutilizados, o debate sobre as questões brasileiras emudecido pelos ditadores;
... pessoas que discordavam desse estado de coisas passaram a ser cassadas, perseguidas, sequestradas, encarceradas, torturadas, desaparecidas, assassinadas;
... livros começaram a ser queimados e destruídos; o cinema, o teatro, a música foram censurados e castrados;
... manifestações de trabalhadores, estudantes e de quaisquer outros grupos, que de alguma forma contestassem ou questionassem a ditadura, foram proibidas ou violentamente dissolvidas;
... a imprensa foi cerceada e mais adiante abertamente censurada, impedindo que a sociedade recebesse informações sobre a realidade nacional;
... liberdade e democracia se tornaram palavras proibidas e valores condenados pelos ocupantes do governo.
Lembrar a data em que essa longa noite de chumbo se instalou sobre o Brasil é dever de todos os cidadãos, não para comemorá-la, mas para recordar essas desgraças que se prolongaram por 21 anos, de 1964 a 1985. Para que as novas gerações saibam que tudo isso sucedeu aqui no Brasil e como foi doloroso. E para que jamais permitam que volte a acontecer semelhante flagelo.


*Um texto do Instituto Vladimir Herzog

sexta-feira, 28 de março de 2014

O Despertar Matutino

*Um texto de Lázaro Ambrósio

O café está quente, excessivamente quente e fumegante. Eu o bebi, e assim queimei o palato.
 Queimei o palato justamente por que desafiei o sinal de perigo que a fumaça do copo quente exalava.
Era uma ameaça clara. Mas não me importei, e no fundo talvez tenha desejado sentir a dor da queimadura. 
Agora permaneço em silêncio, com certa ardência no palato provocada pela minha coragem estúpida.
Entretanto graças a minha insolência perante a natureza, eu pude despertar melhor, pois além do acréscimo de energia que o estímulo da cafeína me oferece, agora tenho também a dor como aliada. Descobri que ela é minha amiga, pois me deixa distante de qualquer sensação de sonolência.
Não quero a sonolência. Ela não me interessa, pois ela é um torpor. A sonolência me faz inútil, uma engrenagem enferrujada na máquina social deste mundo complexo. A sonolência convida-me a inatividade, e me impede de exercer meus ofícios, de cumprir as minhas obrigações e os meus deveres sagrados. Impede-me de ser uma ferramenta útil para a sociedade unificada em que vivo.
Talvez a cafeína tenha parado de exercer sua influência em meu sistema neurológico. E por isso eu fiquei desesperado. E por isso arrisquei meu palato numa aventura infame com este copo super aquecido.

Não odeio a queimadura. Sou sensato e me apego completamente ao seu incômodo incessante. E continuo sorvendo lentamente outros goles agressivos apaixonadamente estimulantes.

quinta-feira, 27 de março de 2014

A lágrima do céu

*Um texto de Lázaro Ambrósio

A chuva caindo faz os meus planos criados para viver um dia perfeito declinarem. Por que pra mim quando chove nada é perfeito. Tudo adquire um aspecto lamurioso. Eu lamento pelo fato da água estar caindo do céu, e lamento por qualquer coisa que venha a acontecer.

Lamento antecipadamente pela moça que terá a roupa encharcada por que esqueceu seu guarda chuva em casa, e lamento por que nenhum cavalheiro irá lhe oferecer abrigo. Eu lamento pelo rapaz que vai xingar o motorista que passará com o carro pela poça e espirrará água com lama em suas roupas surradas. Lamento pelo feirante que não poderá montar sua barraca, ou por aquele que teimosamente montará e vai permanecer na solidão sem seus clientes, que estarão abrigados em seus lares, sem se importar que o feirante tenha montado teimosamente sua barraca num dia chuvoso.

Lamento pelos vendedores nas sorveterias, que não poderão saciar os desejos das famílias e dos casais, e pelo menino descuidado que não poderá se sujar e provocar o riso dos adultos.

Lamento pelas crianças que não poderão brincar na praia ou no parque, e lamento por que elas não se importam com isso. E lamento também pelo morador de rua, que não tem como escapar da fúria da tempestade, mas lamento mais ainda pelo cão que lhe acompanha, que se molhará e depois ficará fedido.

Lamento pela moça bonita que não poderá por aquele salto devastador e aquele vestido perfeito, e não poderá perturbar os sonhos dos homens solitários, e nem conquistar o coração do empresário de sucesso.

Lamento pelo motociclista que vai escorregar e quebrar seus ossos no asfalto liso como manteiga, e lamento pelo telefonema que a família vai receber, e também pelo atendimento que o hospital público vai lhe oferecer.


Lamento principalmente por que eu também esqueci o guarda chuva em casa. E estou á mercê do tempo, perdido nas minhas lamentações.

quarta-feira, 26 de março de 2014

Paganismo Matutino

*Um texto de Lázaro Ambrósio

Se ser criança torna o ser um disparate
No infame mundo da crendice
Infiltra na mente o disfarce
Esplêndido sabor da verdade imaculada

Se do transe hipnotizado acorda
E olhando ao redor não reconhece
O desatino incrédulo do irmão
O pecado pautado parece dissipado

O Papa Francisco sorriu para mim
O Bispo Macedo tocou minha mão
Aquele preto velho previu meu sucesso
O cara azul me traz tanta paz

Resgate do Vale das Sombras pedi
Mas sinto saudade de quando sumi
Relembro o capeta que me recebeu
E da cachaçada que a gente bebeu

A minha Paganice me atacou
Nesta manhã de outono chegado
A família cristã retrucou
Ameaçando bater e deixar-me pelado

Gritando com tochas me conduziram
Ao pau de arara depois para um poste
To aqui amarrado chorando sofrido
O tempo não passa, eu todo aflito

Acende logo e prepara o churrasco
Come da carne de quem duvida
Da tua fé na sustentação da vida
Da crendice bruta de carrasco

Que o pagão amarrado choroso e doído
Por ser um sofrido, o peito moído
Desperta a ira do povo pacífico
Que clama a tortura, o evento específico

Mas se não rimo, não tremo no peito
Não tem mais sentido a quadra e o verso
Pareço somente um perverso
Falando bobagem e perdendo o respeito

Por isso só resta cantarolar
Talvez temperar a platéia que anseia aguardando na mesa
Pelo churrasco das minhas pernas

Cobertas a milanesa

terça-feira, 25 de março de 2014

Trapo - Fragmento de "O Último Suspiro"

*Um texto de Daniel Meirelis

Pode ir embora, e nunca mais pise neste chão
Vá sonhar em outras terras
Mas antes, recolha o seu coração,
Ser pobre é muito duro
Ser palhaço é opção
Vá procurar outro emprego
Quem sabe de traz de um balcão
Pois esse circo, essa vida
Não tem mais lugar pra ilusão

TECIDO TRAPO,
EIS QUE SOU SÓ UM PALHAÇO
SEI QUE SOU SÓ MAIS UM TRAÇO
NESTE CIRCO QUE DEIXEI

VIVER DE BRISA,
ERA SÓ O QUE EU QUERIA
POR VOCÊ EU MORRERIA
PRA VOCÊ EU ME ENTREGUEI

E NESSA PRAÇA
TODA BRISA É PASSAGEIRA
PASSA A VIDA NA CARREIRA
SÓ QUERIA TE PROVAR

QUE MEU AMOR
VOCÊ FOI MINHA PRIMEIRA
TE QUERIA COM ANEL
TE TRARIA DE BANDEJA
MEU CORAÇÃO NO SEU CHAPÉU

INFELIZMENTE
ESSA É A VIDA DO PALHAÇO
CORAÇÃO SEM UM PEDAÇO
POIS PARA SEMPRE TE AMAREI